O Observador
Estou
nesse momento no terraço de um prédio, nem alto nem baixo, zona central de uma
cidade grande qualquer. Passamos das quatro da tarde e os pássaros saracoteiam
no céu azul dessa agradável segunda-feira. Vou me debruçar sobre aquele
parapeito e acompanhar alguns passantes lá de baixo.
É um dos
meus esportes preferidos esse de analisar pessoas desconhecidas, tentar ler
seus pensamentos, imaginar sua história, adivinhar seus próximos passos.
Impressionante como podemos aprender simplesmente observando outros de nós.
Vem
comigo?
Pronto.
Escolhi. Vamos ficar juntos do senhor de chapéu. Gosto de senhores de chapéu,
acredito que eles sejam mais profundos que os outros senhores sem cobertura.
Essa barba branca passa confiança. Acho que vou usar chapéu um dia. Acho que
vou usar barba branca também. Olha, ele entrou naquela porta, na padaria,
certamente vai levar pães quentinhos para seu amor. Todo amor precisa de pães
quentinhos. E doce de leite. Tomara que ele tenha comprado doce de leite.
Saiu, com
uma sacolinha branca na mão esquerda. Você não pode enxergar, mas ele caminha
devagar, passos leves, parece pensativo, mas não de um jeito preocupado, está
mais para sonhador. Gostei desse cara. Carrega um meio sorriso, rosto grande,
faz o tipo bonachão. É como se ele existisse acompanhado de uma música, do
dedilhar de um violão.
Agora
está se aproximando, passando aqui embaixo, pela porta do edifício. Acho que
tem quase setenta, um pouco menos quem sabe. Setenta, quanto tempo de vida,
hein? Provavelmente tenha trabalhado em algo prazeroso. Certo que sim. Será que
acredita em Deus? Desconfio que sim também, difícil alguém chegar nessa etapa
sem dar o braço a torcer. Tomara que o Deus dele seja mais amoroso que o Deus
de alguns. Droga, agora quero conhecer ele de verdade. E lá se vai, depois que dobrar
a esquina nunca mais teremos a oportunidade de saber, só conjecturar.
Não aguentei, estou descendo as escadas, correndo pra alcançar o homem. Não, isso não acontece sempre, mas aquele velho me lembra alguém. Não sei ainda. Nossa, essas escadas não terminam? Quantos andares tem esse prédio? Cheguei ao térreo, abri a porta, quanta gente nessa rua, não pareciam tantos lá de cima. Onde está? Onde está? Consigo sentir o cheiro dos pães. Sim, vi, passando a praça. Com licença, perdão, com licença. Hey senhor, hey senhor de chapéu. Desculpa, preciso perguntar uma coisa. Oi, prazer. O senhor comprou doce de leite?
Não aguentei, estou descendo as escadas, correndo pra alcançar o homem. Não, isso não acontece sempre, mas aquele velho me lembra alguém. Não sei ainda. Nossa, essas escadas não terminam? Quantos andares tem esse prédio? Cheguei ao térreo, abri a porta, quanta gente nessa rua, não pareciam tantos lá de cima. Onde está? Onde está? Consigo sentir o cheiro dos pães. Sim, vi, passando a praça. Com licença, perdão, com licença. Hey senhor, hey senhor de chapéu. Desculpa, preciso perguntar uma coisa. Oi, prazer. O senhor comprou doce de leite?
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